Farooq Sulehria, Counterpunch Magazine, 18.8.2008
tradução de Edu Montesanti

Os senhores da guerra não temem nem os monstros do Taliban, mas uma jovem desarmada: Malalaï Joya

O Ageganistão vive sob o medo dos senhores da guerra apoiados pelos Estados Unidos. Estes odiados senhores da guerra não temem os monstros do Taliban, que aumentam seu poder no sul. Ironicamente, eles vivem com medo de uma moça desarmada nos últimos anos de sua vintena: Malalaï Joya.

Para calar a voz desafiante de Joya, os senhores da guerra, que dominam o Parlamento nacional, suspenderam o mandato de joya por três anos, em 2007. Antes, em quase todas as sessões parlamentares tinha seus cabelos puxados, ou era agredida fisicamente e insultada (“prostituta”). “Inclusive me ameaçaram no Parlamento de estupro”, diz ela. Mas ela não baixa o tom de suas críticas aos senhores da guerra (“eles devem ser processados”, diz Joya), nem à ocupação dos Estados Unidos (“‘guerra ao terror’ é ridícula”). Não é compreendida, mas foi declarada “a mulher mais corajosa do Afeganistão”., e até mesmo comparada a Aung Sun Kyi.

Conhecido nome no Afeganistão (“a mais famosa mulher afegã”, segundo a BBC), Joya voltou à fama em 2003, convocada para ratificar a nova Constituição do Afeganistão. Ao contrário dos fundamentalistas habilmente apoiados pelos EUA, Joya não foi nominada, mas eleita pelo povo da província de Farah para representá-los. Ela surpreendeu a Loya Jirga e os jornalistas presentes na ocasião, quando desencadeou severo discurso, expondo os crimes dos senhores da guerra dominantes na Loya Jirga. O “barba-grisalha”, Sighatullah Mojadadi, presidindo a Loya Jirga, chamou-a de “infiel” e “comunista”. Outros barbados presentes naquela ocasião também gritaram contra ela. Mas antes ela fora calada por uma furiosa organização criminosa dos senhores da guerra, ela havia eletrizado o Afeganistão com seus corajosos discursos.

No curso destes três críticos minutos de discurso, o destino da vida de Joya também mudou. Em sua província natal de farah, os habitantes queriam que ela os representasse nas eleições. Se requer armas e dólares para disputar um campo de batalha eleitoral no Afeganistão. Ela não tinha nada. Mas não podia renunciar centenas de pessoas apoiavam-na e pagavam diariamente por suas visitas, implorando para que ela ficasse. Deste modo, ela decidiu competir à Loya Jirga (Câmara de Comuns do Parlamento nacional). A cineasta imortalizou a valente campanha eleitoral e subseqüente vitória, em seu filme “Inimigos da Felicidade”.

Encontrei Joya inesperadamente em um jantar, quando ela chegou a Peshawar (Paquistão), a caminho do Canadá. Desde que seu passaporte foi confiscado e ela figurou a Lista de Supervisão de Saída, Joya viajava ao Paquistão disfarçada. Educadamente recusando meu pedido de entrevista sob alegação de que conseguira um vôo para a manhã seguinte, prometeu localizar-me em Cabul no fim de março.

Três meses depois, encontramo-nos novamente em Cabul. Como deputada, Joya tinha o direito de alugar uma mansão em um rico baiiro designado a deputados. Contudo, incomodada com ameaças de morte, Joya raramente a visitava. Seus amigos discretamente apontavam à mansão quando dirijiam pelo bairro em nosso caminho a uma casa subterrânea de Joya, onde costuma receber visitas. Em uma entrevista, em meio a uma deliciosa comida afegã e uma conversa depois dela, esta valente mulher compartilhou suas esperanças e medos com Arbetaren. Aqui estão os trechos:

Você recorreu ao tribunal contra sua suspensão. Você contactou Karzai contra sua suspensão?

Joya: Aqui no Afeganistão, temos uma máfia controlando o sistema. São os mesmos senhores da guerra do Parlamento que controlam os tribunais. Estes senhores da guerra da Aliança do Norte aplicam a justiça. Fui afastada porque denominei o Parlamento afegão um estado de gente suja. Estes senhores da guerra exigem minhas desculpas pelo comentário. Eu recuso a desculpar-me por dizer a verdade em alta voz. Não vejo possibilidade de um tribunal controlado pelos senhores da guerra fazer-me justiça. No entanto, uma outra razão foi que, por medo de segurança pessoal, nenhum advogado quis defender minha causa. Agora, um advogado concordou em defender minha causa. Me apresentaria ao tribunal (ella foi ao tribunal em abril). Contudo, diria no tribunal que os senhores da guerra, não eu, deveriam ser levados lá.

A respeito de Hamid Karzai, tem estado vergonhosamente silencioso sobre minha suspensão por um parlamento não democrático. Nunca o contactei. Ele deveria contactar-me. Por outro lado, houvera demonstrações por todo o Afeganistão contra minha suspensão. A polícia de Karzai provou ser boa apenas para dissolver tais manifestações. Mas inclusive Karzai, que poderia fazer? Ele é ridicularizado pelo povo do Afeganistão como chefe de Cabul, já que seu poder não vai além de Cabul.

Como veio Karzai, então, ao poder e como se mantém você declarando que o Parlamento afegão não é democrático, se houve eleições gerais?

Joya: Bom, este é um parlamento em que 80% dos membros são senhores da guerra ou senhores da droga. Eles se apoderam do lugar no Parlamento sob armas ou subornam estes assentos com dólares dos EUA. Em alguns casos, ambos, armas e dólares foram fundamentais. Até os Direitos Humanos acusaram alguns membros líderes deste Parlamento por crimes de guerra. Mas este Parlamento, em uma única jogada, garantiu anistia aos senhores da guerra contra crimes cometidos durante a guerra. Até Mulla Omar pode beneficiar-se desta anistia.

Karzai, que votou nisso como um mal menor, coopera com estes criminosos o tempo todo. Po isso não é de se admirar a impopularidade de Karzai hoje. Mas ele é mantido no poder pelos EUA. A propósito, ouve-se hoje mais do irmão de Karzai em Cabul do que de Karzai, propriamente. Um ou outro projeto de prpriedade de classe alta ou todo caso secundário de corrupção é atribuído am mais jovem Karzai.

Ele é também nomeado quanto ao tráfico de drogas?

Joya: Corrupção e tráfico de drogas tornaram-se grandes questões. Tenho certeza que a segurança é a principal questão. Depois o da corrupção. A tão falada comunidade internacional, que de fato é o governo dos EUA e seus aliados, tem mandado muito dinheiro a eles.

Esta quantidade foi suficiente para construir dois e não um Afeganistão. Mas até mesmo Karzai confessa que este dinheiro teve como destino o bolso dos ministros, burocratas e membros dos parlamentos. por outro lado, ouve-se sobre a mãe disposta a vender sua filha por dez dólares. E não só o irmão de Karzai é um senhor da droga, mas também as tropas estrangeiras estão certamente envolvidas.

Mesmo? Alguma prova? A imprensa noticiou?

Joya: Sim, algumas informações da imprensa têm destacado isso. Por exemplo, a TV estatal russa aludiu à participação das tropas dos EUA no tráfico de drogas. Isto foi noticiado pela imprensa aqui. Mas é como um segredo aberto. Karzai, em um de seus discursos no ano passado, afirmou que não havia só afegãos envolvidos no tráfico de drogas. Ele destacou as conexões estrangeiras. No entanto, ele não nomeou nunhum país ou tropas, mas o povo no Afeganistão entendeu o que ele quis dizer. Agora, as drogas afegãs encontram caminho a Nova Iorque e às capitais européias. Por isso, não se admira que hoje o Afeganistão produza 90% do ópio mundial.

Isto está custando a vida de muitas mulheres. Agora, escutamos sobre “as noivas do ópio”. Quando as colheitas fracassam, os camponeses não são capazes de pagar os empréstimos dos senhores da droga; ao contrário, oferecem em casamento suas filhas aos senhores da guerra.

Por que os EUA estão permitindo que tudo isso aconteça?

Joya: Os EUA estão permitindo que todas as coisas fiquem como estão. O status quo. Um Afeganistão sangrento e sofrido é uma boa desculpa para prolongar sua permanência. Agora, eles estão mesmo abraçando o Taliban. Recentemente, em Musa Qula, um comandante do Taliban, Mulla Salam, foi indicado governador por Karzai. Os EUA não têm problema com o Taliban, enquanto sejam “o nosso Taliban”.

Não só Karzai, mas também todos estes senhores da guerra são mantidos no poder pelos EUA. Isto porque, quando há demonstrações contra aos senhores da guerra, há demonstrações contra as tropas estrangeiras. As pessoas aqui acreditam que os senhores da guerra são amortecidos pelas tropas dos EUA. O povo do Afeganistão tratará destes senhores da guerra quando as tropas dos EUA saírem do Afeganistão.

Você não pensa que a situação de segurança ficará em situação pior se as tropas se retirarem?

Joya: Talvez. Mas diga às pessoas na Suécia que as tropas suecas estão ajudando a realizar a agenda dos EUA no Afeganistão. As pessoas que amam a democracia na Suécia prefeririam que se mandassem doutores, enfermeiros, professores, e que se construísse escolas e hospitais.